INTERTEXTUALIDADE E INTERDISCURSIVIDADE

Dois conceitos distintos, tratados em diferentes perspectivas teóricas, mas que se relacionam no que diz respeito a acionar outros textos e discursos. Ambos dependem da memória discursiva do interlocutor, para assim ter o reconhecimento dos textos ou acionar outros discursos, que neste caso são feitos de maneira inconsciente.

Cavalcante (2012) aborda o fenômeno da intertextualidade e explica que este termo foi usado a primeira vez por Kristeva (1974), em seus estudos na crítica literária, sendo objeto de discussão também em Genette (1992), que estudou sobre os processos intertextuais no discurso literário, e teve adaptações de propostas em Piègay-Gros (1996). Atualmente, a intertextualidade ganha grande destaque na Linguística Textual. 

Cavalcante (2012) aborda a intertextualidade sob ótica de Piègay-Gros (1996), organizando-as em relações por copresença e por derivação. A primeira, divide-se ainda em explícitas, as quais temos as relações por citação e referência, e implícitas, que podem ser vistas nas relações em casos de plágio e alusão. Na segunda, por derivação, são introduzidos os fenômenos de paródia, travedismo bulesco e patische. 

Em casos de relações explícitas por copresença, Cavalcante (2012) diz que estas se realizam quando no texto trazemos fragmentos de outros textos previamente produzidos. A citação é um exemplo deste tipo de intertextualidade, uma vez que marcamos no texto fragmentos do intertexto e, para isso, usamos sinais gráficos para que seja visível a marcação entre os textos. Na referência não há inserção de fragmentos textuais, apenas indicação de autores os quais parafraseamos na escritura do texto. 

Já nas relações intertextuais implícitas, Cavalcante (2012), a respeito do plágio, afirma que é uma apropriação indevida de outros textos sem fazer nenhuma menção dele ou de seu autor. Isso pode acontecer de maneira proposital, para ocultar o intertexto ou por desconhecer a autoria. Referente a alusão, podemos concebê-la como um tipo de referência implícita, uma sinalização deixada no texto, fazendo o interlocutor apelar à memória discursiva para inferir qual o intertexto faz-se alusão.

Ainda em Cavalcante (2012), no que concerce as relações intertextuais por derivação, aquelas que acontecem a partir de um texto previamente existente, temos a paródia, que é uma transformação do texto-fonte, com diferentes propósitos comunicativos seja humorístico, críticos ou poéticos. Esse é um recurso utilizado com frequência em músicas já conhecidas, pertencente a memória coletiva, para gerar humor, e quando o há o reconhecimento da música-fonte produz-se, então, o humor. Há ainda o détournement¸ uma espécie de paródia com valor subversivo, restringindo-se a textos mais curtos, como os provérbios. No travestimento burlesco vemos a retomada do conteúdo, mas modificando a estrutura e estilo com finalidades satíricas. E, por fim, o patische, que também é um tipo de relação intertextual, apresenta diferenças em relação aos tipos anteriores, já que nestes há uma transformação da forma textual, e agora temos a imitação de um autor ou de traços da sua autoria. 

Kristeva (1974 apud. CAVALCANTE, 2012) afirma que todo texto é um mosaico de citações, é uma absorção e transformações de outros textos. Foi pesando nisso que a autora cunhou o termo intertextualidade. Assim como a intertextualidade faz menção a diferentes textos, sob diferentes aspectos, a interdiscursividade também ressalta a relação entre discursos, também acionadas pela memória discursiva de cada sujeito. Orlandi (2013) estabelece a interdiscursividade como “aquilo que fala antes, em outro lugar, independentes”, ou seja, para que o eu discursivo retome discursos já ditos, é preciso que ele já sido dito, em outros lugares e por outros sujeitos. 

A interdiscursividade é aquilo que sustenta os dizeres, tornando-os possíveis e afetando o modo como o sujeito significa em cada memória discursiva. Sob ótica de Orlandi (2013), o saber discursivo torna possível todo o dizer, que retorna na forma de já dito ou pré-construído, recuperados pela memória discursiva, no entanto, feito de maneira inconsciente devidos os esquecimentos enumerados por Pêcheux (1997). É justamente o interdiscurso que disponibilidade esses dizeres, a depender da formação discursiva. 

Para entendermos melhor a interdiscursividade e como ocorre a relação entre outros discursos, pensemos no exemplo dado por Orlandi (2013) com a frase “VOTE SEM MEDO”. A partir da leitura, acionamos diferentes formulações já feitas, mas esquecidas, que pressupõe, por exemplo, as experiências negativas que os sujeitos já sofreram ao expressar opiniões políticas. Essa, bem como outras formulações, são possíveis por meio da interdiscursividade. 

Diante do exposto, entendemos que intertextualidade e interdiscursividade distanciam-se, no tangente a perspectivas teóricas abordadas, mas aproximam-se em razão de estabelecerem relações com os já ditos, sejam eles textos ou discursos. 


REFERÊNCIAS 


CAVALCANTE, Mônica Magalhães. Os sentidos do texto. São Paulo: Contexto, 2012.

ORLANDI, Eni P. Análise de discurso: princípios e procedimentos. 11. ed. Campinas: Pontes Editores, 2013

PÊCHEUX, Michel. Análise Automática do Discurso. In: GADET, F.; HAK, T. (Org.) Por uma Análise Automática do Discurso. Uma introdução à Obra de Michel Pêcheux. Campinas: UNICAMP, 1997.



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